quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Clap, clap, clap! (Aula do dia 09/02)

Como continuar com o trabalho do palhaço? Eis a questão!

Como é de costume, a nona aula da oficina foi planejada juntamente com Renata. Programamos um bloco de três aulas, entre o primeiro dia do nariz e a preparação para a saída. O objetivo das três era amadurecer o trabalho de palhaço de cada aluno, formar duplas, trabalhar com elas e começar a preparar o grupo para a saída de palhaço, no dia 23.

A quarta-feira dia 09/02 foi o primeiro dia desse bloco e a aula seguinte à primeira experiência com o nariz do palhaço.

Para início do encontro, após o nosso ritual habitual de aquecimento, fizemos um jogo de toques com uma bolinha imaginária. Em roda, os alunos deveriam passar a bolinha para o colega, como vôlei, sempre olhando no olho e respeitando as características da bola. Eu não estava tão confiante na eficiência desse jogo, mas após uns tropeços iniciais e acertos com o grupo (foi importante acordar o tamanho da bola, por exemplo), tudo fluiu super bem. Alguns às vezes se distraíam, outras vezes apareciam duas, três bolas imaginárias na roda... Mas o jogo funcionou muito melhor do que eu esperava.

Um pega-pega para esquentar o grupo e um Iupi para colocar o nariz.

Daí seguiu-se três atividades para trabalho do palhaço de cada um. A primeira foi de andanças, as caminhadas de cada palhaço. Andando pelo espaço, os alunos experimentaram diferentes modos de andar, destacando e exagerando características próprias, de sua postura e do seu jeito de se movimentar pelo espaço: mancar ainda mais, rebolar ainda mais, reforçar a corcunda, a movimentação dos braços... O objetivo não é “criar” um andar pro seu palhaço, pois buscamos uma linha bem próxima do que eles são, mas ver a possibilidade de que o palhaço pode exagerar seus ridículos também no andar.

A segunda atividade foi a do aplauso, que já fizemos duas aulas atrás. Desta vez, contudo, a atividade foi conduzida com diferenças significativas. A primeira delas é que os alunos que recebiam os aplausos estavam de nariz vermelho no rosto. A segunda é que o exercício resumiu-se aos aplausos em si, não teve preparação de “eu sou especial porque...”, nem apresentação. O aluno saía da sala, colocava o nariz, entrava, parava em frente à platéia e recebia os aplausos. Recebia, somente. Quando os aplausos cessavam, ele agradecia ao grupo e saía da sala, para então tirar o nariz.

A última distinção é que o aluno que estava fora, à espera para entrar e receber os aplausos, recebeu uma atenção e um preparo especial. Enquanto Renata ficava com o grupo e reforçava a importância daqueles aplausos, de serem grandes, altos, empolgados, eu ficava com a pessoa que estava do lado de fora da sala. Tive a honra de ficar com essa função. Em uma conversa curta, porém direta e profunda com eles, eu ressaltava para cada um a importância daquele momento, de receber aqueles aplausos: “Na vida, a gente só costuma ser aplaudido quando fazemos alguma coisa muito importante. Aqui não precisa fazer nada muito importante. Quem é muito importante é você, do jeito que você é. E você merece esses aplausos, justamente porque só você é do jeito que você é...”

Lindo ver como os olhinhos brilhavam e um sorriso espontâneo e sincero saía toda vez que eu tinha essa conversa. De acordo com as características de cada aluno (ansioso, tímido, inquieto), a conversa focava mais no não fazer nada, no se sentir à vontade ou no deixar receber. Mas sempre o discurso acima era dado e, sempre, um sorrisão era estampado no rosto e, como presente para o grupo, aparecia brilhante no momento de receber os aplausos. Lindo demais.

Em seguida, repetimos o exercício de foco em que se deve seguir uma bolinha com a ponta do nariz (duas aulas atrás, quando trabalhamos os mandamentos da “curiosidade” e “deslumbramento”), dessa vez com o palhaço. Partimos, então, para as atividades em dupla.

Fizemos o exercício do espelho, com as duplas de palhaço que escolhemos no final da última aula e o exercício foi realizado com precisão ainda maior que na última vez. Da posição de um de frente pro outro, o princípio do espelho seguiu com caminhadas em dupla pela sala, reforçando o trabalho anterior com os andares do palhaço.

Propomos então o primeiro exercício de picadeiro. Burnier (2001) afirma que o exercício de picadeiro é o principal dos exercícios em que o praticante do palhaço é confrontado com seu ridículo e sua ingenuidade. Na sua pesquisa, este exercício é feito com a figura do dono do circo, o Monsieur Loyal, que procura algum palhaço que preencha a única vaga oferecida no seu circo. Cada palhaço tem que, um por um, mostrar suas habilidades e tentar conquistar essa vaga. A relação que se estabelece é entre um palhaço que acredita no jogo e faz de tudo para vencer nele e um dono do circo que pode tornar o palhaço o maior perdedor de todos, quebrando as couraças do praticante e suas estruturas defensivas.

No meu caso, eu chamo de exercícios de picadeiro todos aqueles em que é estabelecido a relação de palcoXplatéia com o palhaço e que este tem que mostrar alguma coisa para o grupo que está assistindo. Por opção minha e de Renata, os exercícios de picadeiro desta oficina foram pensados para serem realizados em duplas, a fim de fortalecer os pares, deixar os participantes mais à vontade e alcançar uma capacidade maior de articulação para cena (a facilidade de um ajuda a dificuldade de outro).

O primeiro exercício de picadeiro é a nossa adaptação simplificada do “A gente tem que falar Oi”, que aprendemos com Casali e eu fiz também com De Castro. Na versão “original” (se é que isso existe), uma dupla de palhaços entra em cena para, improvisando, combinar como dar um “oi” pra platéia. Não há ensaios ou acordos prévios. Dada a previsível dificuldade dos nossos alunos com tamanha necessidade de improvisação, nós fizemos uma versão diferenciada do exercício, pensada para ser executadas em duas partes.

A primeira parte ficou para esta aula e os comandos foram bem simples. Divididos em duplas, um palhaço deve perguntar para o outro: “Como vai, como vai, como vai?”. O parceiro responde: “Muito bem, muito bem, muito bem”. O diálogo é repetido, sendo que o palhaço que perguntou agora responde e vice-versa. Esta conversa foi praticada pelos alunos anteriormente, que deveriam dizer as falas com quem encontrassem pela frente. Depois de familiarizados com o diálogo, dividimos o espaço em palco e platéia e cada dupla encena a conversa para o grupo, de um jeito mais criativo.

Correu tudo muito bem. É claro que ainda estavam pegando o jeito, alguns se atrapalhavam um pouco no diálogo e nem todos ousaram tanto na sua apresentação. Tivemos contudo uma feliz surpresa com A., que sempre se mostrou muito tímido (fala bem baixinho, não quis fazer o Iupi) e na sua vez brincou com o corpo e se expressou como ninguém!

Finalizamos o momento dos palhaços com uma despedida das duplas, que foi seguida com o relaxamento para encerrar a aula. Na nossa conversa de avaliação, dois depoimentos interessantes surgiram. Um foi de L., que alegou achar essa coisa de palhaço muito infantil... Eu tenho percebido uma queda no interesse dela de umas aulas pra cá, mas talvez seja o processo dela mesmo, porque sua opinião foi imediatamente contestada pela turma.

O outro foi do próprio A. que, pela primeira vez, se abriu conosco e compartilhou suas dificuldades em falar em público, falar alto, sua timidez. Na hora apontamos para a conquista dele no exercício do “Como vai...?” e Renata ressaltou a importância de usar o corpo também, como uma forma de se expressar.

Acho que esta aula foi importante pra ele, o exercício das palmas, do picadeiro, o depoimento. Antonio deu um grande passo.

E tudo continua andando pra frente...

Palmas a este grupo, por ele ser do jeito que ele é.

Obs: Aula que vem é o dia do figurino e do batizado dos palhaços! Grandes expectativas no ar... Entregamos a eles um convite para uma “festa de palhaços”, para que tragam roupas e junto com algumas minhas e de Renata, montemos um figurino pra cada um. Mais um dia especial por aí...


Referência:

BURNIER, Luis Otavio. O clown. In: A arte de ator: da técnica à representação. Campinas: Unicamp, 2001. (p. 205-221)

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